sexta-feira, 27 de maio de 2016

Quo vadis Homo sapiens(?)?


Nota prévia: Não, não sou de uma espécie diferente. Sou da espécie que a seguir enxovalho por isso mesmo, se quiserem, as notas que se seguem são, em última análise, uma auto-crítica.

Notas soltas:
- trinta seres humanos drogaram e violaram outro ser humano;
- um ser humano adulto, responsável por seres humanos menores, em nome de um dos supostos criadores do ser humano, prendeu pequenos seres humanos a sanitas, obrigou-os a conviver com os cadáveres de outros seres humanos;
- seres humanos eleitos por outros seres humanos derrubam outros seres humanos e aproveitam-se do poder de que foram incumbido para olhar pelos interesses próprios.
Podia continuar com uma sequência infindável de notas soltas sobre seres humanos. Fiquemos por aqui. Não me apetece escrever sobre a violação colectiva no Brasil, o caso do lar cá em Portugal ou a balbúrdia no poder brasileiro.

O ser humano perdeu a humanidade, parece-me. E isso nota-se nas coisas pequeninas.

Dos pontos de onde me é permitido observar e absorver aquilo que o ser humano é e faz vejo cada vez mais situações absurdas, sem sentido, perdidas, incompreensíveis. A minha capacidade de raciocínio revela uma incapacidade tremenda para encontrar razão em boa parte do que vejo e ouço, em boa parte do que presencio.

Às vezes parece-me que o ser humano se move pela ganância, pelo ter, pela pressão da sociedade. Move-se pela inconsciência, pela ignorância, pelo egoísmo.
Às vezes parece-me que não se move por estar agarrado pela apatia, pela dormência, pela resignação. Pelo medo também. O medo dos outros. Do que os outros possam fazer, mas também do que os outros possam não fazer e possam sentir. E o medo do eu. De falhar, mas também de acertar.
Às vezes parece-me que o coração e o cérebro do ser humano se deslocaram para o umbigo (com a proximidade aos intestinos que lhe é reconhecida).

Que caminho segue este ser humano que formou uma sociedade? Que caminho segue esta sociedade?
Chamem-me picuinhas, mas…
- dêem-me uma boa razão para abrir a janela do carro e deitar o plástico da embalagem de pastilhas elásticas que acabei de abrir para a estrada. Têm uma boa razão?
- dêem-me uma boa razão para passar à frente de alguém numa fila. Têm uma boa razão?
- dêem-me uma boa razão para parar num semáforo quando este está verde, só para que um amigo entre no nosso carro. Têm uma boa razão?
- dêem-me uma boa razão para levar para casa, retiradas do meu emprego, resmas de papel, material de construção, livros, pensos rápidos. Têm uma boa razão?
- dêem-me uma boa razão para marcar uma consulta ou um trabalho ou um serviço com alguém e deixar a outra pessoa a esperar 5, 10, 20, 30 minutos ou mais. Têm uma boa razão?

E agora dêem-me boas razões para:
- ver alguém deitar um papel ao chão e não chamar à atenção ou, na pior das hipóteses, nós mesmos apanharmos o papel;
- tolerarmos que alguém passe à nossa frente numa fila;
- não denunciar alguém que claramente prejudica o lugar onde nós trabalhamos;
- não fazer uma reclamação de alguém que não cumpriu com as suas obrigações profissionais.
Têm boas razões?

Sei que são coisas pequeninas quando comparadas com roubos de milhões, corrupção, violência, violações mas, corrijam-me se estiver errado, é absurdo ver uma ligação entre estas coisas todas? A origem não é a mesma?

O ser humano educa pelo exemplo. Mesmo que não queira. E estamos a educar tão mal! E a educação não é apenas das crianças e dos jovens porque afinal de contas... aprendemos toda a vida.


O ser humano, e a sociedade que ele formou, está muito podre, estagnada, pestilenta.

Apetece cantar isto:


J entregou uma pizza à Arrebentábolha, à fritei a pipoca

domingo, 22 de maio de 2016

Vícios privados, públicas virtudes

Costuma-se utilizar a expressão a propósito do carácter ou falta deles de figuras públicas, nomeadamente políticos que enaltecem os seus pontos fortes e fazem por esconder os aspectos mais significativos do seu lado lunar.

Vem isto a propósito de toda esta questão do fim do financiamento a novas turmas das escolas privadas com contrato de associação que se localizem em áreas geográficas em que a exista oferta pública e capacidade instalada para acolher esses novos alunos, de acordo com um despacho recentemente publicado.

Vamos os argumentos: da parte do Governo, o argumento é simples: havendo escolas públicas com capacidade para acolher alunos no próximo ano lectivo, e sendo essas escolas do Estado e portanto, suportadas pelo Orçamento de Estado, não faz sentido estar a financiar essas turmas em escolas privadas com Contrato de Associação, que de acordo com as informações da Secretária da Educação são substancialmente mais caras do que turmas iguais em escolas públicas. Do lado das escolas com Contrato de Associação os argumentos são os de que se põe em causa a liberdade de escolha dos pais na hora de decidir a escola em que querem que os seus filhos estudem; que vai pôr em risco postos de trabalho de professores e funcionários; que é a quebra dos compromissos assumidos com o governo anterior; que impede os pais de escolher o Projeto Educativo que pretendem ver aplicado aos seus filhos.

Há uma série de aspectos que são no mínimo questionáveis nos argumentos apresentados. Senão, vejamos: deve ser incapacidade minha mas, não consigo entender como é que o fim do financiamento público a novas turmas em escolas com contrato de associação é terminar com a liberdade de escolha. Os pais continuam a poder escolher a escola em que querem que os seus filhos estudem. A única diferença é que se pretenderem uma escola privada, provavelmente, terão de pagar. Mas não é assim com tudo? Dar-me-ia muito jeito ter casa própria com três quartos, garagem, jardim e piscina. Como não tenho meios financeiros, nem estabilidade profissional para tal, limito-me a viver num apartamento t2 alugado. Não me passa pela cabeça, alugar a tal casa de sonho e depois ir pedir ao Governo que me pague a renda. Não podem pagar? Existem escolas públicas em que não há mensalidades.

Seguinte: a questão do desemprego é porventura aquela que mais me preocupa, uma vez que põe em causa a estabilidade de famílias e isso é, obviamente, preocupante. Contudo, estou em crer que uma parte significativa dos professores que sejam eventualmente afectados por despedimentos colectivos encontrarão na escola pública lugar para continuarem a trabalhar. Porquê? Porque na escola pública o horário lectivo é de 22 horas enquanto que há escolas com contrato de associação que obrigam os professores a leccionar 30 horas semanais. Conheço vários casos de professores que se encontram actualmente a trabalhar em escolas com contrato de associação que têm um imenso rol de queixas a fazer relativamente às suas escolas/empresas e à forma como estas cumprem (ou não) as suas obrigações com os trabalhadores. Desde atrasos no pagamento, a trabalho extraordinário não pago, horários sobrecarregados, tentativas de condicionamento, abuso de poder, a lista não pára e há vários casos conhecidos e documentados pela comunicação social.

O argumento da quebra dos compromissos assinados com o anterior governo é patético. Tão patético quanto foram os cortes dos subsídios de Natal e de Férias ou os Orçamentos de Estado com pontos inconstitucionais. Os acordos anteriores não foram rasgados. As escolas não foram fechadas. Apenas não terão financiamento público para novas turmas. As já existentes, manter-se-ão até final do respetivo ciclo de ensino. Que sentido faz estar o Estado (e recordo que o Estado somos todos nós!) estar a pagar por algo, que ele próprio tem capacidade de fazer? (Seria muito interessante que este princípio fosse aplicado a outras áreas da sociedade e sectores da função pública portuguesa e negócios do Estado, como as PPP, por exemplo!)

O último argumento apresentado, o do Projecto Educativo é de todos o mais estranho. Não porque os Projectos Educativos sejam pouco importantes mas porque serão muito poucos os pais que escolhem a escola em função do seu Projecto Educativo. Arrisco mesmo dizer que a imensa maioria não sabe sequer o que é o Projecto Educativo, para que serve ou como é construído.
Os pais escolhem a escola dos filhos em função de factores da proximidade de casa ou do seu trabalho, dos horários, das actividades oferecidas, dos transportes escolares que a esmagadora maioria destas escolas oferece.

É que, de repente, quem esteja de fora do mundo da educação pode ser levado a pensar que as escolas com contrato de associação são os pináculos das instituições educativas em Portugal e que as escolas públicas são um antro de perdição, criminalidade e ninho de vícios e maus hábitos.

Não tornem esta questão numa questão de qualidade de ensino, porque não é disso que se trata. Não é uma questão sobre que escolas preparam melhor ou pior. Nem de saber quais têm melhores professores.
Esta é uma questão de gestão racional de recursos financeiros.
Só isso.
E desse ponto de vista, parece-me uma decisão acertada.

E. entregou uma pizza #à 'tou que nem posso; #à forças demoníacas

quarta-feira, 11 de maio de 2016

O dia em que as crianças foram "abusadas" pelas escolas

Imagem da RTP
Tenho visto com alguma repulsa aquilo que os telejornais mostram todos os dias no que diz respeito à luta entre o Ensino Público vs Ensino Privado. Se inicialmente era fácil fazer esta discussão, pois tudo se tratava de uma questão económica e política, as coisas foram evoluindo para um patamar muito mais radicalizado. Uns defendem o Ensino Público, outros o Ensino Privado. Se a forma como público e privado se promiscuem é altamente censurável, ainda aí, a discussão fica restrita ao panorama política e às escolhas governamentais. Quando pensamos que apenas 3% dos colégios privados recebem a maioria dos apoios públicos vemos que a questão não é apenas política ou económica. É, provavelmente, um (ou vários) casos de polícia. E na qualidade de cidadã de um Estado de Direito, exijo justiça.
 
Mas, no meio desta troca de argumentos explicados de todos os lados, dei por mim a ver imagens de crianças de 7 e 8 anos, vestindo camisolas amarelas, gritando à chuva. Será que o país acha isto normal?
 
A verdade é que parece que sim. Os portugueses discutem as vantagens da Escola Pública e o investimento público a determinados colégios privados, sem se aperceberem do que verdadeiramente se está a aqui a passar. Como chegamos aqui?
 
Quem autorizou os professores a deixarem os alunos saírem das salas de aula para virem para a rua nos tempos lectivos?

Quem permite que os próprios filhos façam cordões humanos à volta dos colégios, fazendo as crianças passar horas à chuva?
 
Quem leva os alunos para manifestações no Túnel do Marão ao fim-de-semana (e mais uma vez à chuva)?
 
Quem tenta dizer às crianças que a sua escola vai fechar e que terão que mudar de escola (sabendo que o Ministro da Educação já garantiu que nenhuma das turmas que estão em funcionamento irá fechar)?
 
Que pais aceitam que as aulas sejam convertidas em sessões para escrever cartas aos ministros?
 
Quem autoriza a captação de imagens e vídeos a estas crianças quando dentro da Escola Pública os pais necessitam de autorizar que os seus filhos sejam fotografados nas visitas de estudo?
 
Todas estas imagens inundaram os telejornais e a discussão manteve-se entre as vantagens do Ensino Público e do Ensino Privado. Há muito que já passamos essa discussão. Essa é uma discussão puramente ideológica. Há muito que a discussão passou para o plano humanitário e nós nem nos demos conta.
 
E se de repente, todos os professores da Escola Pública decidissem fazer o mesmo?

Colocassem os alunos a escrever cartas nas aulas para os ministros...  
Colocassem os alunos a manifestar-se pelos seus interesses corporativos...
Levassem os alunos para as manifestações...
Instrumentalizassem pais e crianças...
 
O que diria o país e o mundo disto?
 
É triste, muito triste, ver que as crianças estão a ser "abusadas" desta maneira; E sim, este termo é muito forte mas não será o termo certo? Escolas, pais e professores colocam os seus interesses à frente do bem estar das crianças que deviam proteger. Mas mais do que triste, é CRIME. São crimes contra a Humanidade. São violações dos Direitos das Crianças, consagrados pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, da ONU, e pela Declaração Universal dos Direitos das Crianças, da UNICEF.

Assistir-se em Portugal a uma degradação dos direitos individuais dos cidadãos em detrimento dos interesses económicos é muito mau, mas assistir-se a uma degradação dos direitos das crianças com a cumplicidade dos pais é ainda pior. Onde está a superioridade do ensino ou da educação?
 
Imagem do JN
Terminaria apenas com um artigo da Declaração Universal dos Direitas das Crianças:
 
"O interesse superior da criança deverá ser o interesse director daqueles que têm a responsabilidade por sua educação e orientação; tal responsabilidade incumbe, em primeira instância, a seus pais."
 
 
C. entregou uma pizza à #impalador

segunda-feira, 9 de maio de 2016

Bêbados de Verdades...



“Diga ao mundo que somos felizes”. A frase proferida por provecta cidadã da Coreia do Norte à jornalista da TSF, Margarida Serra, aquando da visita recente desta a um lar na cidade de Pyongyang gerou em mim um sentimento de profundo mal estar, destes que não passam com Alka Seltzer nem com duas garrafas de Água das Pedras. Enganam-se se pensam que dissertarei sobre a “democracia” norte coreana, nas palavras do atual Presidente da Câmara Municipal de Loures, Bernardino Soares. Este sub-produto da Guerra Fria e da inoperância das Nações Unidas, governado pela loucura de Kim Jong-un, com formação académica na mui nobre e insuspeita Suíça, é aos olhos do mundo um enorme buraco negro, onde a repressão e o autoritarismo aniquilam a capacidade de pensar, de respirar até, segundo relatos da mesma jornalista. A zona desmilitarizada, (que jeito dariam aos líderes europeus estes 4 km nas fronteiras para fazer depósitos de refugiados), os testes nucleares, os discursos inflamados de antiamericanismo são propalados aos sete ventos por toda a imprensa mundial.
Longe de mim defender a ideologia Juche, que no fundo prevê que todos trabalhem de forma independente para o bem comum. O BEM COMUM, deus meu!!! O que me causou esta indisposição foi mesmo a headline, “Diga ao mundo que somos felizes”. Resisto à tentação, naturalmente naif, de acreditar nesta sénior de sorriso rasgado e rosto iluminado, que nos declara a genuína felicidade de viver subjugada pela dinastia Kim. Assumo que tal expressão foi encenada e cuidadosamente encomendada e posta na boca – sem dentes, digo eu- da mais insuspeita das criaturas.

Neste pressuposto, vejo-me a mim e a tantos outros a escolher esta atitude subserviente de deixar nos outros a capacidade de pensarem por mim, decidirem por mim, de ser marioneta consciente ao arbítrio de mãos sábias. Que cómoda é esta postura de seguidismo cego. Pensem por mim. Digam-me o que devo pensar. Que bom é ser livre num mundinho onde tudo me é imposto… Este “Diga ao mundo que somos felizes” poderia ser proferido por cada um de nós atores passivos neste mundo globalizado e onde as democracias reinam, ou são reinadas. E convenhamos, em maior ou menor grau, todos gostamos que nos sirvam em lautos banquetes, em embalagens de cores berrantes, de mil aromas e paladares, estas verdadeszinhas prontas a consumir. Quase sempre a nossa liberdade tem expressão máxima, na forma mais ou menos apaixonada, mais ou menos gulosa como engolimos a verdade que queremos. Aqui no burgo, ela- a VERDADE- é-nos servida normalmente por bartenders vestido de rosa, de laranja, azul ou em tonalidades de vermelho, ou pelos televisivos “fazedores de opinião”, quase sempre trajando impecáveis uniformes em tons matizados, que nos propõem cocktails cada vez mais elaborados onde misturam um pouco de tudo … Feita a selecção sobre que realidade vamos consumir é só sentar à mesa e degustar a especialidade da casa: Um Mojito de liberalismo económico, um Bloody Mary de estatização da economia, uma Cuba Livre de estado social mínimo, um Gin tónico de privatização da educação ou da saúde, uma Margarita de nacionalização da banca… e é ver-nos cada vez mais bêbados, espírito torpe, belfos mas eloquentes, a prometer porrada a toda a gente que ouse dizer que a sua verdade é melhor que a nossa.

“Diga ao mundo que somos felizes”… Pobres dos norte coreanos, que submissos professam com vénias às estátuas ou fotografias dos líderes desaparecidos, o seu temor à verdade. Que felizes somos nós, os donos do livre arbítrio e da capacidade para nos sublevarmos…


Deixem-me ser moralista… antes da derradeira bezana, antes das nódoas negras que as escaramuças nas traseiras do bar vos trarão, peçam o menu, beberiquem, experimentem, e depois enfrasquem-se à grande…

A.entregou uma pizza #à politicamente irrelevante
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